Enquanto colocava a
menina para dormir, a mãe conversava com ela:
- Minha filha, nunca,
nunca mesmo desvie de seu caminho escolhido quando for para algum lugar. Está
certo? Entendeu direitinho?
- Sim, mamãe. – Respondeu
a menina. – Boa noite mamãe.
- Boa noite meu anjinho.
20 anos depois...
Sexta, quase
9 horas da noite, Rio de Janeiro
Ela
saiu do trabalho no horário de sempre e seguiu pelo seu caminho também de
sempre. As ruas estavam apinhadas, nos bares e nas calçadas. Os pedintes e os
ambulantes disputam a atenção dos passantes. E mesmo a chuva fina não impede
este transitar.
Andando
rápido em direção às barcas, bolsa firmemente presa à lateral do corpo Raquel
já consegue ver a estação a alguns metros. As pessoas correndo para lá são
sinal de que uma barca está se preparando para sair. Calcula se vale a pena
correr ou esperar pela próxima. Ela estava a ponto de decidir pela corrida
quando ouviu um barulho. Escutou com atenção e percebeu que era o choro de uma
criança. O som vinha da direita, e ninguém mais parecia ouvir ou se importar
com aquele choro. Pudera, hoje em dia quem se importa com outra pessoa a não
ser consigo mesma? Ela estava receosa, mas era um chorinho tão triste, tão doído.
Cortava o coração. Então andou lentamente até uma esquina escura. Ao se
aproximar mais, ainda ouvindo aquele choro, viu uma criança. Ela devia ter
menos de 10 anos, com as mãos nos olhos tentando limpar as lágrimas. As roupas
da menina eram puros farrapos. A garota estava imunda, completamente suja. Suja
de ... Sangue?!
– Ah
meu Deus!
E foi a
única coisa que ela disse antes que a menina pulasse em sua jugular. O resto de
seus gritos ficaram presos na garganta. O sangue quente jorrava abundante. Um
agradável torpor tomou conta de Raquel. Ela se sentiu andando em um belo campo
coberto por flores de lótus coloridas. Mas ela sentiu que o cheiro estava
errado. Não era cheiro de flores, e sim de morte. Ela piscou e viu as flores
sobre o corpo dela, sufocando-a. Ela levou a mão até a sua garganta, sentindo a
falta do ar em seus pulmões e sentiu algo quente e pegajoso. Ao olhar para sua
mão viu que era sangue, seu sangue. Quando olhou novamente para frente viu a
menininha rindo, limpando o canto da boca com sua linguinha rubra. Raquel
estava de volta à Praça XV e sentiu o exato momento em que seu coração parou de
bater.
Nenhum comentário
Postar um comentário
Agradecemos pelo comentário!