[Resenha de Tinta] Fale!

Título Original: Speak!

Autor: Laurie Halse Anderson
Edição: 1
Editora: Valentina
ISBN: 9788565859073
Ano: 2013
Páginas: 248
Tradutor: Flávia Carneiro Anderson

Sinopse: “Fale sobre você... Queremos saber o que tem a dizer.” Desde o primeiro momento, quando começou a estudar no colégio Merryweather, Melinda sabia que isso não passava de uma mentira deslavada, uma típica farsa encenada para os calouros. Os poucos amigos que tinha, ela perdeu ou vai perder, acabou isolada e jogada para escanteio. O que não é de admirar, afinal, a garota ligou para a polícia, destruiu a tradicional festinha que os veteranos promovem para comemorar a chegada das férias e, de quebra, mandou vários colegas para a cadeia.
E agora ninguém mais quer saber dela, nem ao menos lhe dirigem a palavra - insultos e deboches, sim - ou lhe dedicam alguns minutos de atenção, com duvidosas exceções. Com o passar dos dias, Melinda vai murchando como uma planta sem água e emudece. Está tão só e tão fragilizada que não tem mais forças para reagir.
Finalmente encontra abrigo nas aulas de arte, e será por meio de seu projeto artístico que tentará retomar a vida e enfrentar seus demônios: o que, de fato, ocorreu naquela maldita festa?

Olá Pessoal,

A resenha de hoje é sobre um assunto sério e, portanto não terá gracinhas. O tema do livro Fale! é sobre um fato que ocorre todos os dias com milhares de pessoas no mundo.
É uma situação que todos nós devemos conhecer discutir e principalmente criar meios para impedi-la.
Vamos conhecê-la?

#Resenha:

    "Fale! Mudou a minha vida 
me tirou da concha
me fez pensar nas festas
me deu asas, este livro
Eu sussurrei, eu gritei
arregacei as mangas
Eu detesto falar
mas estou tentando
Você fez com que me 
lembrasse de quem sou,
Valeu!"

Melinda Sordino não fala. E não ela não é muda. Apenas não sente vontade de falar. Mas pensa, pensa muito no que aconteceu, no que as outras pessoas diriam se soubessem, e o que aconteceria se ela falasse.
Tudo acontece depois de uma festa em que ela vai com sua atual ex melhor amiga Rachel e seu irmão Jimmy. 
Tecnicamente, Melinda não deveria frequentar festas de veteranos do ensino médio, ela tem apenas 13 anos e está no final do ensino fundamental, mas como Jimmy já é veterano, concorda em levar as meninas para se distraírem. Além do quê, os pais de Melinda estão fora e ela vai mesmo dormir na casa de Rachel...
Porém, aí uma "inocente" diversão transforma-se no caos. Para Melinda, que sem ter outra ideia, liga para polícia, e os para outros participantes da festa, que com a chegada desta, entram em apuros.
Isso a transforma na pária de um colégio que ela sequer começou a estudar. E é assim que o livro começa.
O primeiro capítulo mostra o primeiro dia de aula de Melinda, no novo colégio de Ensino Médio e toda a dinâmica que ocorre em qualquer escola do mundo. Os grupinhos de aluno, os professores que "pegam" no pé, ou que são estranhos ao primeiro contato.
Logo no primeiro dia, Melinda tem uma mostra do que será a atmosfera infernal do Ensino Médio,quando é "agredida" durante o almoço e ai invés de ser acudida, é criticada:

E assim,assistindo junto a protagonista as aulas de Álgebra, Biologia, Espanhol e Artes. Como toda adolescente Melinda cria apelidos diferentes para cada professor como Mister Pescoço, Dona Juba, que demonstram toda sua ojeriza por eles, embora ela só não externe sua opinião. Observamos também que ela sequer presta atenção nas aulas, a não ser em artes.
Em artes, ela encontra o professor Freeman que dá aos alunos um projeto inusitado: Sortear uma palavra dentro de um globo terrestre quebrado, que será seu tema durante todo o ano. A palavra de Melinda é arvore.
É por esse meio, que instintivamente, mesmo sem querer, Melinda começa a se comunicar. Por desenho, ou tentativas de desenho, não palavras.
Os capítulos vão passando, os fatos escolares acontecendo, e vemos Melinda ficar ainda mais retraída, depressiva, mas em meio tudo isso, ela  no inicio, ainda consegue fazer uma "amiga" Halther que é nova no colégio, e como todo adolescente que é integrado a um grupo que antes não conhecia, é também deixada de lado pelos colegas. Não que seja agredida como Melinda, mas ainda assim, abandonada e por isso, a única pessoa que a "aceita" é Melinda. Mas logo Halther começa a se integrar e a esperança da protagonista de fazer uma amizade vai por água a baixo, Halther não deixa de ser mais uma, mesmo que de modo diferente, a abusar de Melinda. 
Depois disso, as notas de Melinda caem, ela não se concentra, não presta a atenção as aulas, a não ser em seu projeto de artes, e entra em cena o conselho educacional e os pais de Melinda. Incapazes de perceber o que está acontecendo, eles apenas a criticam, castigam a menina que vai perdendo cada vez mais a voz e o viço até chegar a um ponto que ela simplesmente desiste. Não vai a escola, fica perambulando por praças e shoppings e até, alheia a tudo e claro, seu desempenho caí. 
Novamente, os pais de Melinda, ainda não percebendo algo errado, já que são centrados apenas nos seus problemas, profissão e dinheiro repreendem a menina. Melinda até tenta focar, volta a assistir as aulas mas é inútil, ela esta cada vez mais perto do fim do poço.
Até que em uma aula com Mr. Pescoço, em que ele faz um comentário extremamente racista, ela vê seu tímido parceiro de bancada, nerd CDF, David Petrakins, a pessoa quem ela nunca achou que levantaria a voz, tomar uma atitude e discordar do professor e mesmo sob ameaça, não abrir mão de sua posição e falar, contando inclusive com a ajuda de seus pais, que tomam atitudes contra o desmando do professor em relação a seu filho.
Nesse momento, Melinda percebe que falar, ou melhor, expressar-se pode ser uma boa ideia, mas infelizmente para a menina isso não dá certo. E ela é mais uma vez criticada e punida.

Assim, Melinda segue sua trajetória, não fala, não é ouvida, seus desenhos mostram algo errado, não é interpretada, não estuda, tira notas baixas, é repreendida, não age, Em um circulo vicioso, que só é interrompido quando ela percebe que se não tomar uma atitude outras pessoas sofrerão como ela. Algumas inclusive, ela descobre que já sofreram, mas como ela se calaram.
No início, como se passou muito tempo, ninguém a escuta, ela é tomada como invejosa, mentirosa e recalcada, o que a faz se retrair, mas quando as circunstâncias podem a levar de volta ao que aconteceu na festa, Melinda não fala, ela grita!
O fim do livro é em aberto e não sabemos o que acontece com Melinda,se ela consegue punir seu principal agressor, se ela retoma as amizades, se os pais tomam ciência do que aconteceu, mas isso não importa, porque uma coisa a gente sabe, agora Melinda vai falar.

Falando do livro em geral, essa edição que a Valentina trouxe para o Brasil, é a edição comemorativa de 10 anos de Fale! que foi originalmente lançado em 1999, uma época que a discussão dos assuntos do livro, abuso e bullying não estavam tão em voga como hoje e que foi um marco na história dos livros infanto-juvenis lançados no EUA.
Fale! Ganhou diversos prêmios e adotado como material paradidático lá fora, o que eu acho que deveria acontecer aqui também.
Essa versão conta com depoimentos de alguns leitores que a autora transformou em poema, de onde saiu o trecho que abre essa  resenha, depoimento da autora sobre o livro,sobre cartas e comentários que recebeu e sobre de onde surgiu a ideia de escrevê-lo. Traz também um guia de discussão que como eu já disse, pode e deve ser usado como um material paradidático e dados sobre abuso no Brasil.
Fora isso, o projeto gráfico do livro é lindo, com sua capa aveludada e de acordo com a história e com a divisão de partes feita pelo registro escolar de Melinda e fazendo analogia ao que será mostrado com a árvore de Melinda.
A principal diferença de Fale! para outros livros do gênero é que sua linguagem é simples, dinâmica e mesmo contando com uma protagonista que não fala, seus pensamentos refletem toda a ironia e pensamentos conflitantes dos adolescentes.
 A autora, Laurie Marie Anderson,que tem outros livros adotados para escola e o excelente Garotas de Vidro, lançado aqui pela Editora Novo Conceito, consegue retratar o dia a dia de qualquer colégio do mundo, chamando a atenção de não só quem passa/passou pelo problema, mas dos pais que muitos vezes, por seus próprios problemas, não conseguem perceber o que acontece com seus filhos, achando que o que supostamente "é da idade", já que a adolescência é um período difícil, pode esconder um problema maior.
Mostra o que acontece, infelizmente, também no ambiente escolar. Onde os professores e o conselho educacional que deveriam estar atentos aos problemas do corpo discente, enxergam apenas a ponta do iceberg, ou melhor explicando, apenas quando os afeta, como no caso do desempenho escolar.
Além disso, a obra ainda faz mesmo quem, nunca pensou no problema, perceber que algumas atitudes do outro, mesmo que por motivos diferentes dos mostrados, podem ser reflexivos de angustias maiores, e mesmo que você não saiba qual, com um pouco de atenção pode ajudá-lo.
Não tenho mais elogio a Fale! a não ser indicá-lo a todas pessoas, adolescentes ou não. Que passaram pelo problema ou não.
Talvez, após a leitura, você consiga escutar o grito silencioso do seu colega ao lado.
Minha única frustração é ter mantido esse livro tanto tempo na estante sem escutá-lo me chamando, ainda bem que agora pude ouvi-lo, não é?
Só para terminar, eu disse que essa resenha não teria gracinha, mas eu não resisto: Não sei se todo mundo sabe, mas Fale! foi filmado em 2003 e lançado com o nome de O Silêncio de Melinda. (A Dani nossa colunista da Telinha de Tinta vai trazer a resenha dele no sábado, não perca!) e a atriz Kristen Stewart faz o papel de Melinda.
Pergunto: Tinha papel mais adequado a atriz do que um de uma personagem que não fala?


Até a próxima,



Um comentário

  1. gostei bastante de conhecer o livro, por se tratar de um assunto serio já despertou o meu interesse, ultimamente tenho lido muitos livros assim, que nos fazem refletir

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Agradecemos pelo comentário!